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STF INICIA JULGAMENTO DE TEMA REPETITIVO 1214 QUE DECIDIRÁ SOBRE A INCIDÊNCIA DE ITCMD NOS PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA.

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

O Supremo Tribunal Federal deu início esse mês no julgamento do tema repetitivo de nº 1214 (RE 1.363.013) que tem como objeto analisar a incidência de ITCMD (imposto causa mortis) sobre os planos de previdência privada – PGBL/VGBL -, no caso de falecimento do titular.

O caso teve origem no Estado do Rio de Janeiro que possui norma estadual admitindo a incidência de ITCMD nos planos de previdência privada (PGBL/VGBL). Submetida a análise de constitucionalidade da referida norma declarou o TJRJ a inconstitucionalidade do dispositivo estadual em relação a incidência do referido imposto sobre os planos de previdência privada na modalidade VGBL, reconhecendo, porém, a constitucionalidade do dispositivo para os planos na modalidade PGBL.

A decisão foi levada ao Supremo Tribunal Federal, tendo sido afetado o Recurso Extraordinário de nº 1.363.013 pelo relator, Min. Dias Toffoli, a questão para julgamento assim deduzida

“Discute-se, à luz dos artigos 125, § 2º, e 155, I, da Constituição Federal, se o contexto do qual resulta a percepção de valores e direitos relativos ao PGBL e VGBL pelos beneficiários, em razão do evento morte do titular desses planos, consiste em verdadeira “transmissão causa mortis”, para efeito de incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), haja vista acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que declarou a inconstitucionalidade da incidência do tributo sobre o VGBL, mas a constitucionalidade da incidência sobre o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL).

O Min. Dias Toffoli, em seu voto, decidiu pela inconstitucionalidade da incidência de ITCMD sobre os planos de previdência privada em ambas as suas modalidades – PGBL e VGBL sugerindo a seguinte tese para o assunto em discussão:

“É inconstitucional a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) quanto ao repasse, para os beneficiários, de valores e direitos relativos ao plano Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) ou ao Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) na hipótese de morte do titular do plano”.

O voto proferido pelo relator foi acompanhado pelos Min. Flávio Dino e Alexandre de Moraes e está sob análise do Min. Gilmar Mendes que solicitou vista dos autos. Há, portanto, três votos a favor do contribuinte.

O julgamento afetado é de extrema relevância tendo em vista que a reforma tributária em tramitação no Congresso Nacional busca implementar a cobrança de ITCMD sobre os planos de previdência privada (PGBL/VGBL).

É preciso destacar que, prevalecendo o entendimento do Min. Relator de inconstitucionalidade da incidência de ITCMD sobre os planos de previdência privada (PGBL/VGBL), a norma nascerá sobre o estigma da inconstitucionalidade (muito embora ela deva ser declarada expressamente a posteriori).

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ANÁLISE DA PROPOSTA DE RETIRADA DO CÔNJUGE DO ROL DE HERDEIROS NECESSÁRIOS

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

Certamente você já ouviu falar que há um projeto de lei tramitando no Congresso Nacional para atualizar o Código Civil de 2002 e que, especificamente em matéria sucessória, uma das propostas é retirar o cônjuge do rol dos herdeiros necessários.

Mas afinal, você sabe o que isso significa?

Primeiro é preciso esclarecer que há duas espécies de herdeiros: os necessários, nele abrangidos os descendentes, ascendentes e cônjuges, de acordo com o art. 1.845 do CC; e os colaterais, que acresce ao rol já citado os parentes em até quarto grau do falecido (ex. irmãos), de acordo com o art. 1.839 do Código Civil.

A legislação vigente determina que 50% dos bens deixados pelo falecido devem, obrigatoriamente, ser deixados aos seus herdeiros necessários. Essa limitação ao direito de dispor da totalidade do próprio patrimônio é denominada, para fins sucessórios, de legítima. Essa restrição não protege, entretanto, os colaterais.

Portanto, sempre que há filhos (descendentes), a lei impõe aos seus genitores a obrigação de deixar 50% de seu patrimônio a eles; não havendo filhos, são os pais herdeiros necessários em concorrência com o cônjuge; e, na falta dos ascendentes é o cônjuge herdeiro necessário da parte dita indisponível.

Mas e o restante do patrimônio?

Os outros 50% do patrimônio podem ser atribuídos a qualquer pessoa que o falecido tenha interesse de beneficiar, pois faz parte de sua parte disponível, podendo ser realizado um testamento para instituir tal benesse.

Pois bem… A proposta em análise no Congresso Nacional, ao contrário do que vem sendo amplamente divulgado, não tem como finalidade retirar o direito do cônjuge de receber herança de seu cônjuge ou companheiro(a). O que se busca é alterar a classificação atualmente atribuída aos cônjuges/companheiros os quais deixarão de ser considerados herdeiros necessários para se tornarem herdeiros colaterais.

Ou seja, o que de fato se propõe é que a legítima, os 50% que são reservados pela lei, seja atribuída exclusivamente aos filhos e aos pais do falecido; porém, nada impede que o cônjuge/companheiro(a) receba parcela do patrimônio do(a) falecido(a) através da parte disponível.

Então, se o(a) cônjuge/companheiro continua sendo herdeiro por que há tanta discussão sobre o assunto?

É preciso destacar que a proposta não surge com o intuito de prejudicar o cônjuge ou companheiro(a) sobrevivente, mas para proteger os descendentes e ascendentes em tempos em que as famílias não mais são constituídas para durar permanentemente. O número de famílias reconstituídas pós-divórcio, somado às conquistas alcançadas pelas mulheres, como a sua inserção no mercado de trabalho e com o direito potestativo (obrigatório) do divórcio, já não nos permite mais olhar as mulheres como dependentes econômicas de forma generalizada.

Ademais, dos regimes patrimoniais existentes na legislação vigente, somente a comunhão obrigatória de bens impede a comunicação do patrimônio entre os cônjuges em caso de falecimento. Ou seja, mesmo a separação convencional, regime eleito pelos próprios cônjuges/companheiros no ato do casamento/união estável, não impede a comunicação do patrimônio por morte, mas apenas em caso de divórcio.

A proposta em análise pelo Congresso Nacional, se comparada com o atual regramento civil brasileiro, traz evidente prejuízo ao cônjuge/companheiro se aprovada. Isso porque o cônjuge/companheiro somente terá direito à parte do patrimônio do(a) falecido(a) pela herança se este (falecido) assim se manifestar expressamente; ou, se não houver descendentes ou ascendentes vivos.

Além disso é preciso considerar que não temos o hábito de pensar na morte e quais as consequências que dela advirão. Veja-se como exemplo os inúmeros inventários judiciais onde os herdeiros litigam por anos buscando uma compensação pela suposta “preterição” sentida, seja entre filhos, cônjuges etc. Neste sentido, pode-se afirmar, sem qualquer receio, que condicionar o recebimento de herança do cônjuge/companheiro(a) à realização de testamento, na prática, o(a) relega à condição de não herdeira.

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COMO O PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO ME ASSEGUROU O “DIREITO” DE MORRER EM PAZ…

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

O assunto é delicado. Eu sei. Não temos o hábito de conversamos sob a morte. Reconhecer a finitude da vida conflita com a ilusão da eternidade. Mas prometo tentar abordar o assunto com a leveza que ele merece…

Ao contrário do que você deve estar pensando não foi o Direito que mudou minha forma de encarar a morte, mas sim as histórias que vivi e ouvi durante a faculdade… Já perdi amigos em acidente de trânsito e já acompanhei de perto o impacto que a perda prematura de um pai/mãe pode causar em uma estrutura familiar…

Essas experiências me marcaram de tal forma que confesso sempre tive, como mãe, a preocupação do que aconteceria com meus filhos caso algum dia eu faltasse e eles ainda não fossem autônomos e independentes…

Foi esse pensamento que me fez assumir a responsabilidade de diminuir o impacto que uma possível perda poderia ocasionar na vida dos meus filhos, através de um pequeno planejamento sucessório pessoal, garantindo a estabilidade financeira deles para que possam obter autonomia e independência com certa tranquilidade se necessário…

E ao assim fazer adquiri o “direito de morrer em paz” sabendo que fiz tudo o que estava ao meu alcance para reduzir as preocupações e dores que certamente serão experimentadas quando esse evento vier a ocorrer.

É exatamente disso que se trata o planejamento sucessório: é reconhecer que não temos controle sob todos os acontecimentos de nossas vidas e que algumas dores serão sentidas independentemente do que façamos, mas que outras podemos reduzir consideravelmente.

Tenho certeza de que essa preocupação não é apenas minha e faz parte da realidade de muitos pais por aí… E é nesse contexto que posso assegurar que não é preciso ter um imenso patrimônio para assegurar o futuro de seu filho: basta clareza, organização, planejamento e amor.

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PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO: AFINAL O QUE É?

Começo o presente artigo afirmando que, das poucas certezas que temos nessa existência, é que um dia a vida se esvai, embora sejamos relutantes em encarar essa realidade…

Nossa “estadia” nesse mundo, ou como diriam os espiritualistas, nessa dimensão, é finita, tendo data certa de início e fim, embora não tenhamos conhecimento de quando exatamente a vida se esvairá temos plena consciência que ela um dia acabará tal qual hoje a conhecemos.

Falar da morte, talvez por conta de nossas crenças religiosas e culturais, é encarado em nossa sociedade como sinônimo de mau agouro, especialmente em tempos em que muito se difunde a ideia de que “atraímos aquilo que pensamos (ou focamos)” sendo esse um assunto “proibido” para muitas famílias brasileiras.

Aos que ficam resta encarar o luto e o vazio da ausência daquele ente querido que se foi e lidar com os desdobramentos dessa perda sejam eles de fundo emocional (o luto propriamente dito), financeiro (perda de parte significativa da renda familiar etc.), familiar (discussões entre herdeiros – irmãos e viúva – abalando a estrutura familiar em alguns casos de forma irreversível com o rompimento de vínculos familiares), jurídico (despesas com inventário, advogado, tributos etc.), etc.

Situações como as citadas acima são costumeiramente vivenciadas pelas famílias brasileiras exatamente porque aprendemos, desde muito cedo, a não pensar na morte, como se isso nos garantisse que não a vivenciaremos.

É preciso encarar o desenlace de forma madura e deixar de lado o medo e as crenças religiosas negativas que nos foram incutidas desde que nascemos para nos permitirmos vivenciar o luto de forma “limpa”, dissociada de toda e qualquer questão que não seja de fundo exclusivamente emocional, a fim de manter intacta nossa estrutura familiar, patrimonial, empresarial etc.

Mas isso é possível?

A resposta é sim, basta planejar de forma prévia a transferência do patrimônio de seu titular originário aos seus sucessores de forma a respeitar não apenas a vontade do proprietário do patrimônio mas também a legítima (reserva patrimonial destinada por lei aos herdeiros necessários).

Esse planejamento prévio é denominado no Direito de planejamento sucessório e vai muito além da tão difundida holding familiar, que é uma, mas não a única, ferramenta utilizada para proteger o patrimônio envolvido, sendo possível a utilização da doação com cláusula de reversão, doação com cláusula de usufruto, fideicomisso, testamento, seguro de vida, previdência privada, sucessão da pessoa jurídica, escolha e alteração de regime de bens etc.

Um planejamento sucessório bem estruturado é aquele que é feito de forma pessoal e atende aos interesses do titular do patrimônio e de seus herdeiros inexistindo uma única solução jurídica para todas as situações existentes, especialmente porque há uma multidiversidade de pensamentos, ideias, prioridades etc. que são ínsitos de cada um de nós. Assim, nem tudo que é prioridade e importante para uns tem o mesmo peso e efeito para outros…

Quais as vantagens de se fazer um planejamento sucessório?

Dentre as vantagens do planejamento sucessório destaco:

  1. Sensação de pertencimento e de inclusão de todos os herdeiros, pois todos são previamente ouvidos, havendo baixa probabilidade de discussões posteriores, preservando-se a afetividade e as relações familiares;
  • Rapidez na partilha o que reduz o impacto do tempo na administração do patrimônio (afasta inventários longos, bloqueio de bens etc.);
  • Garantia de continuidade do negócio;
  • Economia de custos póstumos com custas processuais (inventário, advogado etc.) e tributária (menor incidência de tributação).

Qual o melhor momento para fazer um planejamento sucessório? O planejamento sucessório é instituto de prevenção, logo, a indicação é que seja feito o quanto antes, especialmente porque a depender da estratégia a ser utilizada, ele demandará um certo tempo para sua implementação total.

Angela Carla Zandona Ubialli – Advogada especialista em Direito Empresarial pela FGV e atuante nas áreas de Direito de Família e Sucessório.