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PROGRESSIVIDADE DO ITCMD: IMPACTOS E PANORAMA NO ESTADO DO PARANÁ

A Emenda Constitucional n.º 132/2023 definiu que o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – também conhecido como ITCMD ou ITCD – será progressivo, levando em conta o valor da herança ou da doação.

Em uma tentativa de implementar a progressividade e ampliar a arrecadação tributária, diversos Estados brasileiros editaram novas leis estabelecendo alíquotas variáveis, normalmente entre 2% e 8%, com base no montante herdado ou doado. Essa medida materializa o princípio da capacidade contributiva, segundo o qual, de forma simplificada, “quem possui maior capacidade de pagamento, contribui mais”.

No Estado do Paraná, a adoção da progressividade também esteve em pauta. Em 2 de dezembro de 2024, foi submetido à Assembleia Legislativa do Paraná, em regime de urgência, o Projeto de Lei n.º 730/2024. Essa proposta legislativa previa, entre outras medidas; (i) a introdução de alíquotas progressivas para o ITCMD, que atualmente possui alíquota única de 4% no Estado; (ii) a majoração do teto para 8%; e, (iii) a ampliação da incidência do imposto para incluir bens situados no exterior.

Contudo, em razão da intensa pressão exercida pelo setor produtivo, liderado pela Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Paraná (FACIAP), o projeto foi retirado de pauta. A entidade destacou a necessidade de promover amplos debates com a sociedade antes de implementar qualquer ajuste fiscal dessa magnitude.

Na prática, a retirada do ITCMD do texto do Projeto de Lei n.º 730/2024 mantém, para o ano de 2025, a alíquota fixa de 4% para o imposto incidente sobre doações e sucessões no Paraná. Eventuais alterações de alíquota só poderão ser implementadas a partir de 2026, caso uma nova lei estadual seja aprovada, em conformidade com os princípios da anterioridade anual e da anterioridade nonagesimal.

Assim, o Paraná, na contramão de diversos Estados da Federação, mantém para o exercício corrente a alíquota fixa de 4% sobre o valor herdado ou doado, além de isentar do imposto as doações ou heranças de bens imóveis localizados no exterior, quando o beneficiário for residente no Estado, e de bens móveis situados no Paraná, mesmo que o doador ou beneficiário esteja domiciliado no exterior.

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O ÚLTIMO DESEJO DE CID MOREIRA: HERANÇA, POLÊMICAS E TESTAMENTO.

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli.

Cid Moreira, um dos mais conhecidos âncoras do jornalismo brasileiro, faleceu em 03/10/2024, aos 97 anos, deixando um patrimônio de 60 milhões, sendo 40 milhões em imóveis e 20 milhões em contratos de direitos autorais.

O falecimento do apresentador dá início a uma séria disputa sucessória, considerando a existência de testamento deserdando os descendentes, deixado a herança integralmente para a cônjuge sobrevivente.

Como regra geral, o ordenamento jurídico brasileiro garante aos herdeiros necessários, entre eles o cônjuge e os filhos (descendentes), o direito à legítima, que corresponde a 50% do patrimônio deixado pelo autor da herança, sendo que os outros 50% podem ser dispostos conforme a vontade do testador.

Há casos, entretanto, em que o Código Civil garante ao falecido o direito de excluir sucessores de sua herança. Isso ocorre, por exemplo, quando o herdeiro (necessário) pratica homicídio contra o genitor/genitora ou sua companheira (CC, art. 1.814, I); quando calunia em juízo o autor da herança ou pratica crime contra sua honra (CC, art. 1.814, II); ou, ainda, quando utiliza meios fraudulentos para impedir que o autor da herança disponha livremente de seus bens por ato de última vontade (CC, art. 1.814, III).

Vale ressaltar que Cid Moreira e seus filhos já não mantinham uma boa convivência há tempos, conforme informações colhidas em jornais de grande circulação (ex. O Globo, UOL, Terra etc.), sendo que Cid Moreira atribuiu esse afastamento ao interesse exclusivamente financeiro que seus filhos tinham por ele.

A conturbada relação familiar foi exposta em 2021, quando os filhos, Roger e Rodrigo, propuseram uma ação judicial pleiteando a interdição de seu pai, motivados pela alegação de que a atual esposa do apresentador o mantinha em cárcere privado e usufruía indevidamente dos bens, alienando-os e remetendo o produto da venda para o exterior.

Embora o processo judicial tenha sido extinto após a comprovação de que o apresentador gozava de plena capacidade civil e jamais foi mantido em cárcere ou sofreu maus tratos por parte de sua esposa, essa situação serviu como motivadora da exclusão dos filhos da sucessão por meio do testamento.

Entretanto, a mera declaração de vontade do testador não é suficiente para excluir, de forma definitiva, os filhos da sucessão hereditária, sendo necessária a abertura judicial do testamento para verificar a inexistência de causas que possam afetar a validade e eficácia do documento. Isso inclui a capacidade civil (“sanidade mental”) e se o motivo imputado aos descendentes é causa justificadora da deserdação.

Ao que tudo indica, não existem causas que possam anular o testamento realizado por Cid Moreira, que, certamente, esteve muito bem orientado na execução de seu ato de última vontade. Anualmente, ele revisava o testamento, reafirmando sua vontade e comprovando sua plena capacidade civil por meio de laudos médicos prévios (e provavelmente póstumos), além de a cônjuge do apresentador ter sido inocentada do crime de cárcere privado e maus tratos.

As cautelas tomadas pelo apresentador são determinantes para a validade da exclusão dos filhos da sucessão patrimonial, e devem ser reconhecidas judicialmente para que o testamento tenha plena eficácia.

Embora a disputa iniciada por Roger e Rodrigo demonstre um sério e longo litígio, a oposição dos herdeiros demandará intensa produção de provas para ter chances de prosperar.

Além disso, tudo indica que o planejamento sucessório de Cid Moreira já foi realizado, prevendo a existência do litígio. O apresentador se cercou de todas as cautelas necessárias para afastar eventuais alegações de nulidade envolvendo sua capacidade civil e justificativas das causas de exclusão dos herdeiros, sendo bastante provável que ele tenha assegurado, por outros meios legais, a sobrevivência financeira confortável de sua esposa até que o litígio sucessório se resolva.

Fontes de notícias utilizados para a realização desse artigo:

  1. ‘Foi um engano te adotar’: em e-mail, Cid Moreira disse a filho que o deserdaria no testamento (globo.com)
  2. Cid Moreira queria deserdar filho: é possível tirar herdeiro de testamento no Brasil? (infomoney.com.br)
  3. Testamento deixado por Cid Moreira deserda filhos; saiba os motivos (terra.com.br)
  4. Cid Moreira tentou deserdar filhos: o que diz a lei sobre testamentos (uol.com.br)
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ATUALIZAÇÃO DE IMÓVEL EM IR PARA VALOR DE MERCADO. BREVE ANÁLISE DA LEI 14.973/2024.

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

Em 16/09/2024, foi publicada a Lei 14.973/24, que permite ao contribuinte atualizar o valor do imóvel constante em seu Imposto de Renda para o valor de mercado, pagando imposto de renda sobre ganho de capital de 4% para pessoas físicas e de 10% para pessoas jurídicas (6% de IRPJ + 4% de CSLL). A referida lei foi regulamentada, na sequência, pela Instrução Normativa 2222 da Receita Federal.

Mas, antes de adentrar na análise da referida lei e sua norma regulamentadora, destaco que se engana quem imagina que o Governo Federal foi benevolente com o contribuinte ao permitir a atualização do valor de imóveis com a redução da alíquota do imposto sobre ganho de capital de 11% para pessoas físicas e de 5% a 12,5% para pessoas jurídicas, porque definitivamente não foi. A finalidade é meramente arrecadatória, diante da necessidade de gerar caixa para tentar finalizar o ano fiscal com as contas no ‘azul’, já que os gastos públicos estão em constante majoração.

Feita essa ressalva, confesso que, ao contrário da ampla divulgação que tem sido feita na mídia, não vejo vantagens na atualização do imóvel no Imposto de Renda nos moldes permitidos pela Lei 14.973/24 e pela IN 2222 da Receita Federal.

Primeiro, porque já existem situações nas quais o contribuinte pode se valer de isenção ou redução considerável do ganho de capital, previstas na Lei do Imposto de Renda, dentre elas: (i) a existência de redutores significativos aplicáveis a imóveis adquiridos há longa data; (ii) a utilização do produto da alienação de um imóvel para a aquisição de outro no prazo de 180 dias; e (iii) se o valor do imóvel for de até R$ 400.000,00 (…). Nesses casos, não há dúvidas de que a aplicação da isenção é mais vantajosa do que a utilização da ‘benesse’ prevista na Lei 14.973/24.

Segundo, porque a alíquota de 4% para pessoas físicas e de 10% para pessoas jurídicas não é aplicável de forma automática a qualquer caso. A lei estipula, em seu art. 8º, parágrafo único, um critério objetivo para determinar a alíquota aplicável, qual seja, o tempo decorrido da data da atualização até a data da venda do bem.

Assim, se um contribuinte (pessoa física) decide atualizar o valor do imóvel na data de hoje, 02/10/2024, só poderá se valer da alíquota de 4% sobre o ganho de capital se permanecer com o bem por um período de 15 anos contados da data de atualização. No exemplo dado, até 02/10/2039.

Ainda assim, o contribuinte não estará isento do imposto sobre ganho de capital por ter feito o ‘adiantamento’ do imposto ao se valer da Lei 14.973/24. É preciso lembrar que o fato gerador do ganho de capital é a valorização imobiliária, e, se esta ocorrer no período de 15 anos, o referido imposto será devido no momento da venda.

Há também casos em que o contribuinte (pessoa física), ao optar pela atualização do imóvel pela Lei 14.973/24, poderá vir a pagar 19% de imposto sobre ganho de capital. Isso ocorrerá se o contribuinte atualizar o valor do imóvel em 02/10/2024 e vier a aliená-lo em menos de 36 meses, pois não há previsão de abatimento do valor antecipado a título de ganho de capital.

Assim, digamos que o imóvel esteja valorado no IR/2024 em R$ 100.000,00 e seja atualizado para o valor de mercado de R$ 1.000.000,00 em 02/10/2024. Nesse caso, o contribuinte (PF) deverá recolher, à vista, R$ 36.000,00 de imposto sobre ganho de capital (alíquota de 4%).

Se esse mesmo imóvel for alienado em 02/10/2026 por R$ 1.000.000,00, o contribuinte pagará, a título de ganho de capital, R$ 135.000,00 (15%) pela operação, não podendo descontar o montante pago na atualização (R$ 36.000,00). Logo, na prática, pagará, a título de ganho de capital, o valor total de R$ 171.000,00.

Ocorrendo a alienação no período de 36 a 180 meses, o valor a ser pago a título de ganho de capital deve obedecer a uma fórmula prevista em lei, devendo o contribuinte observar a alíquota incidente na operação, que também está prevista no parágrafo único do art. 8º da Lei 14.973/24.

É claro que, em alguns casos, haverá ‘ganho’ ao contribuinte, porém em valor inferior ao que ele poderia obter se investisse o montante do imposto em uma operação financeira, sem contar que poderá se beneficiar dos redutores pelo tempo de aquisição do imóvel, caso a alienação ocorra após um período considerável, como já acontece atualmente.

Por isso, insisto que é preciso ter plena ciência da finalidade e das intenções do contribuinte antes de aderir à atualização proposta na lei em análise, pois, como diz o ditado popular, ‘não há almoço grátis’, especialmente quando se trata de ‘benefícios’ fiscais.

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STF INICIA JULGAMENTO DE TEMA REPETITIVO 1214 QUE DECIDIRÁ SOBRE A INCIDÊNCIA DE ITCMD NOS PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA.

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

O Supremo Tribunal Federal deu início esse mês no julgamento do tema repetitivo de nº 1214 (RE 1.363.013) que tem como objeto analisar a incidência de ITCMD (imposto causa mortis) sobre os planos de previdência privada – PGBL/VGBL -, no caso de falecimento do titular.

O caso teve origem no Estado do Rio de Janeiro que possui norma estadual admitindo a incidência de ITCMD nos planos de previdência privada (PGBL/VGBL). Submetida a análise de constitucionalidade da referida norma declarou o TJRJ a inconstitucionalidade do dispositivo estadual em relação a incidência do referido imposto sobre os planos de previdência privada na modalidade VGBL, reconhecendo, porém, a constitucionalidade do dispositivo para os planos na modalidade PGBL.

A decisão foi levada ao Supremo Tribunal Federal, tendo sido afetado o Recurso Extraordinário de nº 1.363.013 pelo relator, Min. Dias Toffoli, a questão para julgamento assim deduzida

“Discute-se, à luz dos artigos 125, § 2º, e 155, I, da Constituição Federal, se o contexto do qual resulta a percepção de valores e direitos relativos ao PGBL e VGBL pelos beneficiários, em razão do evento morte do titular desses planos, consiste em verdadeira “transmissão causa mortis”, para efeito de incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), haja vista acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que declarou a inconstitucionalidade da incidência do tributo sobre o VGBL, mas a constitucionalidade da incidência sobre o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL).

O Min. Dias Toffoli, em seu voto, decidiu pela inconstitucionalidade da incidência de ITCMD sobre os planos de previdência privada em ambas as suas modalidades – PGBL e VGBL sugerindo a seguinte tese para o assunto em discussão:

“É inconstitucional a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) quanto ao repasse, para os beneficiários, de valores e direitos relativos ao plano Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) ou ao Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) na hipótese de morte do titular do plano”.

O voto proferido pelo relator foi acompanhado pelos Min. Flávio Dino e Alexandre de Moraes e está sob análise do Min. Gilmar Mendes que solicitou vista dos autos. Há, portanto, três votos a favor do contribuinte.

O julgamento afetado é de extrema relevância tendo em vista que a reforma tributária em tramitação no Congresso Nacional busca implementar a cobrança de ITCMD sobre os planos de previdência privada (PGBL/VGBL).

É preciso destacar que, prevalecendo o entendimento do Min. Relator de inconstitucionalidade da incidência de ITCMD sobre os planos de previdência privada (PGBL/VGBL), a norma nascerá sobre o estigma da inconstitucionalidade (muito embora ela deva ser declarada expressamente a posteriori).

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ANÁLISE DA PROPOSTA DE RETIRADA DO CÔNJUGE DO ROL DE HERDEIROS NECESSÁRIOS

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

Certamente você já ouviu falar que há um projeto de lei tramitando no Congresso Nacional para atualizar o Código Civil de 2002 e que, especificamente em matéria sucessória, uma das propostas é retirar o cônjuge do rol dos herdeiros necessários.

Mas afinal, você sabe o que isso significa?

Primeiro é preciso esclarecer que há duas espécies de herdeiros: os necessários, nele abrangidos os descendentes, ascendentes e cônjuges, de acordo com o art. 1.845 do CC; e os colaterais, que acresce ao rol já citado os parentes em até quarto grau do falecido (ex. irmãos), de acordo com o art. 1.839 do Código Civil.

A legislação vigente determina que 50% dos bens deixados pelo falecido devem, obrigatoriamente, ser deixados aos seus herdeiros necessários. Essa limitação ao direito de dispor da totalidade do próprio patrimônio é denominada, para fins sucessórios, de legítima. Essa restrição não protege, entretanto, os colaterais.

Portanto, sempre que há filhos (descendentes), a lei impõe aos seus genitores a obrigação de deixar 50% de seu patrimônio a eles; não havendo filhos, são os pais herdeiros necessários em concorrência com o cônjuge; e, na falta dos ascendentes é o cônjuge herdeiro necessário da parte dita indisponível.

Mas e o restante do patrimônio?

Os outros 50% do patrimônio podem ser atribuídos a qualquer pessoa que o falecido tenha interesse de beneficiar, pois faz parte de sua parte disponível, podendo ser realizado um testamento para instituir tal benesse.

Pois bem… A proposta em análise no Congresso Nacional, ao contrário do que vem sendo amplamente divulgado, não tem como finalidade retirar o direito do cônjuge de receber herança de seu cônjuge ou companheiro(a). O que se busca é alterar a classificação atualmente atribuída aos cônjuges/companheiros os quais deixarão de ser considerados herdeiros necessários para se tornarem herdeiros colaterais.

Ou seja, o que de fato se propõe é que a legítima, os 50% que são reservados pela lei, seja atribuída exclusivamente aos filhos e aos pais do falecido; porém, nada impede que o cônjuge/companheiro(a) receba parcela do patrimônio do(a) falecido(a) através da parte disponível.

Então, se o(a) cônjuge/companheiro continua sendo herdeiro por que há tanta discussão sobre o assunto?

É preciso destacar que a proposta não surge com o intuito de prejudicar o cônjuge ou companheiro(a) sobrevivente, mas para proteger os descendentes e ascendentes em tempos em que as famílias não mais são constituídas para durar permanentemente. O número de famílias reconstituídas pós-divórcio, somado às conquistas alcançadas pelas mulheres, como a sua inserção no mercado de trabalho e com o direito potestativo (obrigatório) do divórcio, já não nos permite mais olhar as mulheres como dependentes econômicas de forma generalizada.

Ademais, dos regimes patrimoniais existentes na legislação vigente, somente a comunhão obrigatória de bens impede a comunicação do patrimônio entre os cônjuges em caso de falecimento. Ou seja, mesmo a separação convencional, regime eleito pelos próprios cônjuges/companheiros no ato do casamento/união estável, não impede a comunicação do patrimônio por morte, mas apenas em caso de divórcio.

A proposta em análise pelo Congresso Nacional, se comparada com o atual regramento civil brasileiro, traz evidente prejuízo ao cônjuge/companheiro se aprovada. Isso porque o cônjuge/companheiro somente terá direito à parte do patrimônio do(a) falecido(a) pela herança se este (falecido) assim se manifestar expressamente; ou, se não houver descendentes ou ascendentes vivos.

Além disso é preciso considerar que não temos o hábito de pensar na morte e quais as consequências que dela advirão. Veja-se como exemplo os inúmeros inventários judiciais onde os herdeiros litigam por anos buscando uma compensação pela suposta “preterição” sentida, seja entre filhos, cônjuges etc. Neste sentido, pode-se afirmar, sem qualquer receio, que condicionar o recebimento de herança do cônjuge/companheiro(a) à realização de testamento, na prática, o(a) relega à condição de não herdeira.

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STF INICIA JULGAMENTO PARA DEFINIR A LEGALIDADE DA COBRANÇA DE IR SOBRE DOAÇÃO

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

Em 06/08/2024 teve início o julgamento do RE 1.439.539 no STF para definir a legitimidade (leia-se legalidade) da cobrança de IR sobre doação.

O julgamento submetido ao Supremo tem origem em uma decisão proferida no TRF da 4ª Região em mandado de segurança preventivo onde um contribuinte pede a declaração de inexigibilidade do imposto de renda sobre doação de bens e direitos, a valor de mercado, para transferência de seu patrimônio, em vida, a seus filhos.

Alega o contribuinte que o imposto devido para doações é o ITCMD, de competência estadual, previsto no art. 155, I e §1º da CF, incumbindo ao donatário, em regra, o recolhimento do referido imposto, inexistindo enquadramento legal válido para incidência de imposto de renda sobre a doação. Assevera que não há ganho de capital na doação, pois quem doa um bem sofre decréscimo patrimonial.

A Receita Federal, através da PGFN, entende que sobre a doação noticiada também deve incidir o imposto de renda utilizando o valor de mercado como base, tendo em vista eventual ganho auferido na atualização do valor do bem na transferência da propriedade só constatada com a doação. Logo, para a PGFN essa suposta valorização de mercado constitui o aumento patrimonial que dá ensejo a cobrança do IRPF, cuja responsabilidade pelo pagamento é atribuída ao doador.

No Supremo a matéria é bastante controvertida…

De um lado a 1ª Turma, em decisão já proferida no ARE 1.387.761, já afastou a incidência de IR sobre a justificativa da vedação de bitributação. D’outro lado a 2ª Turma, no julgamento do RE 1.269.201, permitiu a cobrança do IR sobre a doação, afastando a tese da bitributação.

O julgamento iniciado ontem teve seu desfecho postergado, por 90 dias, ante ao pedido de vista do Min. Luiz Fux, reiniciando a votação que já contava com quatro votos favoráveis ao contribuinte.

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A PROPOSTA DE TAXAÇÃO DE PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA E SEU IMPACTO NO PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO FAMILIAR.

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

A proposta de taxação dos planos de previdência privada encaminhada pelo Governo Federal ao Congresso Nacional tem sido objeto de uma série de debates entre juristas, investidores e especialistas em finanças.  

Os planos de previdência privada (PGBL e VGBL) são comumente utilizados para complementar a aposentadoria pública e assegurar uma velhice mais tranquila com a manutenção do atual padrão de vida do investidor, sendo esse um importante instrumento de planejamento sucessório atualmente. A adesão aos planos de previdência privada oferece vantagens fiscais aos investidores que sofrerá substancial alteração de modo a comprometer a atratividade desse tipo de investimento.

A implementação da tributação sobre os planos de previdência privada tem como intuito promover o aumento da arrecadação do governo, mas pode ter efeitos adversos sobre os investidores, pois a medida pode reduzir a rentabilidade líquida dos investimentos, desestimulando a adesão a esses planos.

Diante dessa possível mudança, o planejamento sucessório familiar torna-se ainda mais relevante, pois que constitui a previdência privada uma ferramenta sucessória eficiente que permite que os seus beneficiários recebam os recursos destinados pelo planejador sem a necessidade de inventário.

Com a proposta de taxação, é essencial que as famílias revisem suas estratégias de sucessão patrimonial para minimizar os impactos tributários. Medidas como doações em vida, elaboração de testamentos detalhados e a criação de holdings familiares podem ser alternativas para garantir uma transferência de patrimônio mais eficiente e com menor carga tributária.

A adaptação a um novo cenário tributário exige um planejamento cuidadoso e a análise de todas as opções disponíveis para proteger e maximizar o patrimônio familiar, sendo a conscientização sobre a importância do planejamento sucessório e a compreensão das implicações tributárias fundamentais para navegar com sucesso nesse período de incertezas e mudanças.

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A REFORMA TRIBUTÁRIA E O PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO.

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli.

A mídia nacional tem noticiado, quase que diariamente, aspectos relevantes da proposta de reforma tributária em tramitação no Congresso Nacional.

Embora a proposta de reforma tributária tenha sido apresentada sobre a justificativa de se simplificar procedimentos fiscais, a realidade que se vê é bem distinta e, o que se observa, na prática, é o aumento da carga tributária já bastante elevada em nosso país.

Nesse sentido é possível se afirmar que a prevenção nunca foi tão vantajosa, especialmente no tocante ao planejamento da sucessão patrimonial, o que tem elevado a busca por tais serviços em escritórios especializados antes da reforma tributária ser implementada.

Primeiro porque é possível aproveitar as atuais estruturas e incentivos fiscais disponíveis, pois muitos planos de sucessão utilizam mecanismos legais que poderão ser alterados ou até mesmo revogados com a reforma tributária proposta, tornando essas janelas de oportunidade ainda mais valiosas.

Segundo porque a antecipação do planejamento sucessório permite maior flexibilidade e controle sobre como os ativos serão transferidos e geridos no futuro. A reforma tributária pode introduzir novas regras ou aumentar a carga tributária sobre heranças e doações (ITCMD), o que pode impactar negativamente as estratégias de planejamento se não forem implementadas antes das mudanças legislativas.

Terceiro porque é de extrema relevância se observar o tempo necessário para estruturar um plano de sucessão eficaz uma vez que o processo pode envolver avaliações patrimoniais, ajustes em estruturas jurídicas, revisões de contratos e documentos, entre outras medidas que demandam tempo e planejamento cuidadoso. Antecipar-se à reforma tributária possibilita realizar essas etapas com calma e sem pressões adicionais impostas por alterações repentinas na legislação.

E, por fim, planejar a sucessão antes da reforma tributária ser efetivada proporciona tranquilidade e segurança aos envolvidos. Famílias e empresários podem garantir que seus desejos sejam atendidos de acordo com as leis vigentes, protegendo o patrimônio acumulado ao longo dos anos e garantindo a continuidade de negócios e investimentos sem sobressaltos tributários inesperados.

Esses são alguns dos principais motivos pelos quais o planejamento sucessório tem se destacado como produto/serviço ofertado por escritórios especializados, sendo uma estratégia inteligente e lícita para maximizar benefícios fiscais, preservar o patrimônio familiar e empresarial, e garantir uma transição tranquila e eficiente para as próximas gerações.

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COMO O PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO ME ASSEGUROU O “DIREITO” DE MORRER EM PAZ…

Dr.ª Angela Carla Zandoná Ubialli

O assunto é delicado. Eu sei. Não temos o hábito de conversamos sob a morte. Reconhecer a finitude da vida conflita com a ilusão da eternidade. Mas prometo tentar abordar o assunto com a leveza que ele merece…

Ao contrário do que você deve estar pensando não foi o Direito que mudou minha forma de encarar a morte, mas sim as histórias que vivi e ouvi durante a faculdade… Já perdi amigos em acidente de trânsito e já acompanhei de perto o impacto que a perda prematura de um pai/mãe pode causar em uma estrutura familiar…

Essas experiências me marcaram de tal forma que confesso sempre tive, como mãe, a preocupação do que aconteceria com meus filhos caso algum dia eu faltasse e eles ainda não fossem autônomos e independentes…

Foi esse pensamento que me fez assumir a responsabilidade de diminuir o impacto que uma possível perda poderia ocasionar na vida dos meus filhos, através de um pequeno planejamento sucessório pessoal, garantindo a estabilidade financeira deles para que possam obter autonomia e independência com certa tranquilidade se necessário…

E ao assim fazer adquiri o “direito de morrer em paz” sabendo que fiz tudo o que estava ao meu alcance para reduzir as preocupações e dores que certamente serão experimentadas quando esse evento vier a ocorrer.

É exatamente disso que se trata o planejamento sucessório: é reconhecer que não temos controle sob todos os acontecimentos de nossas vidas e que algumas dores serão sentidas independentemente do que façamos, mas que outras podemos reduzir consideravelmente.

Tenho certeza de que essa preocupação não é apenas minha e faz parte da realidade de muitos pais por aí… E é nesse contexto que posso assegurar que não é preciso ter um imenso patrimônio para assegurar o futuro de seu filho: basta clareza, organização, planejamento e amor.

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HOLDINGS IMOBILIÁRIAS E A IMUNIDADE DE ITBI NA INTEGRALIZAÇÃO DO CAPITAL SOCIAL

A notícia é importante, a decisão judicial é irrepreensível e a comemoração é salutar. Em 11/04/2023 o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, através do seu Órgão Especial, proferiu (no processo n.° 0705115-03.2021.8.07.0018) uma decisão importantíssima para o planejamento sucessório e tributário, que se instrumentaliza através da criação das holdings familiares, em face da imunidade tributária do art. 156 da Constituição Federal  (§ 2.°, inciso I).

            O artigo 156, § 2.°, inciso I, não sofreu qualquer alteração desde a promulgação da Constituição Federal. O texto atual está na sua redação original. E sua interpretação e aplicação vem trazendo embates acirrados de incidência de ITBI entre os Municípios (protegendo sua arrecadação tributária) e os Contribuintes (que invocam a imunidade do texto constitucional) quando houver incorporação de bens imóveis em realização de capital social.

            Existem diversos métodos para a interpretação da lei: literal ou gramatical, lógica, histórico-evolutiva, sistemática, teleológica e sociológica. Mas o ponto de partida será sempre o texto escrito. É através do texto (também com suas regras gramaticais) que o legislador procura, com as melhores palavras e expressões, exteriorizar de forma lógica a intenção que com ele se procura alcançar, de modo a assegurar a razão final ou de ser da norma promulgada. No caso do artigo 156, § 2.°, inciso I, a imunidade concedida é de uma clareza evidente (como a luz solar); mas as legislações municipais e a interpretação dada ao texto constitucional pelas Fazenda Municipais estão sempre negando a evidência, não importando o critério de interpretação utilizado.

            No caso decidido pelo TJDFT estava em discussão a constitucionalidade de lei local, que não concedia a imunidade tributária de ITBI na utilização de imóveis para integralização de capital se a atividade preponderante da sociedade for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.

            Embora a decisão (acórdão) ainda não tenha sido publicada (para se conhecer seu inteiro teor), a certidão do resultado do julgamento não deixa a menor dúvida sobre esse importante precedente, que deu ao texto constitucional a sua verdadeira dimensão, em interpretação que não só decorre do sentido literal da linguagem (que Norberto Bobbio define como a palavra, ou signo, e o significado dela), mas assegura sua aplicação lógica, que decorre da sua própria razão de ser.

            Em assim decidindo, o TJDFT assegurou que o imposto de transmissão de bens imóveis (ITBI) “não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital“. Ponto. Sem qualquer condição. Não importa se o objeto social da holding (emprego livre do termo) é compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil, ou que essa atividade seja preponderante ou não. O entendimento do TJDJT é direto: não incide ITBI na incorporação de bens para realização de capital social. O ramo de atividade é irrelevante para a imunidade tributária.

            A decisão está sujeita a recurso. Mas é um precedente fabuloso e deve ser celebrado por todos aqueles que estão na área do planejamento sucessório e tributário.

Artigo de autoria do Dr. Lincoln Fagundes, especialista em Direito Societário e Imobiliário.